segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Gira

A gira da terra
A gira da roda
Eu quero ver girar
Gira a vida
Gira a esfera
Para sempre
Eu quero ver girar
Gira mundo
Gira moinho
Eu quero ver girar
Para sempre
Gira o vento
Gira a poeira da terra
Eu quero ver girar
Gira no compasso
Gira girando
Para sempre
Eu quero ver girar
Gira tempestade
Gira o trovão no ar
Eu quero ver girar
Para sempre
Gira pedra no barranco
Gira água do rio selvagem
Eu quero ver girar
Gira toda vida dentro do círculo sagrado

As estações virando e girando
O grande ciclo da vida e da morte
As estrelas de todas as galáxias, o universo
Da condensação ao silencioso trovão final
A gira do sol e da lua na esfera celeste
Círculo sagrado das esferas da vida
Eu quero ver girar

Paulo Renault

Iceberg

Não acredites no que digo
Afinal tu sabes o que sou
Mas por saber minha natureza
Sabes que sou farsa e verdade
Se no mundo só há farsa
A ele trarei verdade
Para que se envergonhe de seu íntimo
Se no mundo só há verdade
Na sua face esfregarei a farsa
Para que rias de seu ar vetusto
Mas nesse mundo de farsa e verdade
Sou aquilo que sou e tu vês
Sou o duo intrínseco inerente
Sou o superficial, sem substancia
Navegando sem opinião no mar de gente
Mas sou eu, alvo e puro na superfície
Iceberg profundo, invisível nas águas escuras
Rasgando as entranhas dos transatlânticos
De estupidez
Afundando os grandes cargueiros
De ignorância
Arrastando ao fundo das águas escuras
Os náufragos congelados de iniqüidade
Sou eu mesmo e aquilo que tu vês
A verdade dentro de uma farsa
A farsa da verdade perdida
Uma mentira contada tantas vezes
Que agora é uma verdade
Mesmo que nela ninguém creia

Paulo Renault

Madrugadas Insones

Além da janela há uma noite escura e fria
de vento sibilante que abre suas lâminas
de navalha sobre minha pele descoberta
o sono acaricia meu rosto, mas como uma mulher
não me toma em seus braços, espera que eu me renda
mas resisto aquele carinho frágil
espanando as areias de meus olhos escuros
acendo um cigarro, sorvo a fumaça cinza
ouço o estalar lento do fumo incandescente
atravesso insone a noite, qual vaso de guerra
perguntam-me alguns se jamais durmo
aos quais respondo “às vezes, quando me lembro “
a natureza dúbia dos lobos, despertos com o sol
uivando nas montanhas para a lua das noites escuras
nunca me fazem o óbvio questionamento
“o que procuras através dessas madrugadas”
porém agradeço não o fazerem, pois nesse caso
mesmo eu não saberia a resposta a dar
atravessei insone as noites quentes de lua cheia
e agora que ela se foi, minguando vagarosamente
as noites são frias e solitárias, prenúncio de inverno
neste outono sem folhas crepusculares flutuando
o dia chega mansamente, mais uma vez
cinzento como a fumaça que sopro no ar parado
tímido, o sol mostra sua face para os lobos
e me pergunto o que busco nas madrugadas insones
que pacientemente, tanto aguardo chegarem

Paulo Renault

Teus Olhos


Era a calma mansa de um dia ensolarado
As paredes reluziam o ouro que descia dos céus
Eu vagava, sem promessas, pelas ruas brilhantes
Sentindo a brisa suave que corria manhosa
Fazia sol, fazia brilho, fazia luz
Então senti a sombra que se aproximava
Sombra doce, mas pungente
Coleando sinuosa, tomando meu corpo
Espalhando-se pela pele, por meus olhos
Noite profunda na tarde radiosa
Duas luas novas eclipsando o sol abrasador
Teus olhos, selenes de paragens fictícias
Deusas hipnóticas das montanhas estreladas
Neles enxerguei os segredos de Pandora
Consagração de beleza e terror
Em sua discreta calma disfarçada
As tempestades açoitando a terra seca
Os lampejos brilhantes cortando a escuridão
Perdido no fundo de teus olhos
Vi morte e renascimento, estrelas cadentes
Enxerguei o alfa e o ômega do Universo
E toda a verdade esquecida do mundo
Atravessado pela dor lancinante
Dos ventos cortantes que vem distantes
Me aqueci no calor de vulcões incandescentes
Encontrando prazeres lânguidos
Nos teus olhos de coriscos azuis e verdes
Encontrei as profundezas das águas escuras
Dos saveiros adormecidos e dos seres abissais
Vi as fogueiras das bruxas, dançando na floresta
As incontáveis velas que iluminavam os salões
Dos bailes de vestidos longos de pedrarias reluzentes
Teus olhos, duas luas novas de noite mágica
Neles antevi as presas brancas do caçador noturno
E antes que me perdesse no labirinto translúcido
A aurora retornou do horizonte já esquecido
O sol subiu aos céus e teus olhos se foram
Duas luas que retornaram a noite distante
Deixando em seu lugar um delírio tépido
De quem viu além do horizonte onírico

Paulo Renault

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Na Veia

Meu íntimo desejo incandescente de ti
Vem atropelando sôfrego na minha veia
Avalanche estrondosa de fogo e cobiça de teu ser
A outrora insana vontade de ter
Tornou-se a dor pungente da tua falta
Agora só há sentido verdadeiro em teus lábios
Destino a seguir no vento de teus cabelos
Crença nos contornos de teu corpo perfumado
Teu pulsar corre abrasador na minha veia
Mesclado em meus fluidos tépidos
Minha carne te deseja, minha pele te anseia
O ar cáustico que sobra opresso em meu peito
Está impregnado de teu ser cálido
Que se alastra célere entre músculos, fibras e veias
Minha boca se afoga cobiçosa em pensamento
Na minha saliva que é a mesma do teu beijo
Meus sentimentos cruzam artérias e capilares
Arrastando violentos prazeres lancinantes
No sangue intenso e vermelho de gosto agressivo
Leio tua suave voz em meus ouvidos
Vejo as palavras espelhadas em teu rosto
Correndo fulgente em meu ser que sinto teu amor
Corpo flamejante nas entranhas do meu corpo pleno
Amo-te na veia, sempre

Paulo Renault